Relatório mensal: Brasil – Selic rumo à queda

Equipe econômica do C6 Bank, liderada por Felipe Salles, divulga projeções

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A equipe econômica do C6 Bank, liderada por Felipe Salles, divulgou nesta quinta-feira (13) mais uma edição do seu relatório macroeconômico. Confira, abaixo, a íntegra do documento:

Resumo

Internacional

A economia global desacelerou, tanto nas grandes economias desenvolvidas quanto na China. Nos países desenvolvidos, as taxas de juros elevadas, em meio à inflação persistente, explicam o menor crescimento. Nos Estados Unidos, na Área do Euro e no Reino Unido, os bancos centrais indicaram que a política monetária deve se tornar mais restritiva nos próximos meses. Na China, a atividade perdeu força após a reabertura no início do 1T23. Algum estímulo pode ser anunciado pelo governo, mas com a intenção de alcançar a meta de crescimento de “em torno de 5%”, não de promover uma forte aceleração da economia.

Brasil

O crescimento deste ano está sendo impulsionado pela safra recorde de grãos. Há sinais de enfraquecimento, porém menos intenso do que o esperado. Revisamos nossa projeção de crescimento do PIB de 2% para 2,5% em 2023 e projetamos 1% de expansão em 2024.

O resultado primário do setor público consolidado deve ser deficitário em 1% do PIB em 2023. Esse número incorpora parte das medidas fiscais anunciadas pelo governo. Para 2024, projetamos déficit de 0,7% do PIB.

Para a taxa de câmbio, projetamos R$ 5,30 ao final de 2023 e R$ 6 ao final de 2024. Contribuem para essa estimativa a perspectiva de queda da Selic e a elevação da dívida pública.

A queda do IPCA vem sendo influenciada em grande parte por fatores pontuais. A inflação deve voltar a subir nos próximos meses. Para 2023, o IPCA deve ficar em 5,8%. Para 2024, esperamos que a inflação desacelere lentamente e fique em 5,5% ao final do ano.

O Copom manteve a taxa Selic estável em 13,75% na reunião de junho e sinalizou uma possível queda de juros na próxima reunião. Revisamos a nossa expectativa de Selic de 12,5% para 12% ao final de 2023 e de 11% para 9,5% em 2024.

Panorama Global

EUA

A economia americana tem apresentado crescimento fraco, abaixo do potencial, mas não esperamos uma recessão. Temos visto uma divergência entre o desempenho do setor de manufaturas, em contração, e serviços, mais resiliente com expansão moderada. Os dois setores costumam andar juntos e a recente divergência pode ser explicada por um mercado de trabalho aquecido, que gera renda e mantém o consumo (que é, em sua maior parte, composto de serviços) elevado.

Apesar da atividade mais fraca, o mercado de trabalho continua robusto. A demanda por trabalhadores segue alta, o número de vagas em aberto por desempregado está em 1,6, o que é consistente com salários crescendo acima da produtividade. A taxa de desemprego continua baixa (em 3,6% no mês de junho) e permanece próxima da mínima em 40 anos. As contratações diminuíram, mas ainda estão acima da média de 2018-2019, período pré-pandemia, e podem ser reflexo da escassez de trabalhadores disponíveis.

A inflação segue pressionada por serviços. Por conta da pressão baixista de itens voláteis, como passagens aéreas e veículos usados, o CPI de junho veio mais fraco que o esperado. A composição do índice mostra que o setor de bens, mais afetado pelos juros, já não é mais uma preocupação. A inflação de serviços, por outro lado, continua sendo um desafio, já que o mercado de trabalho norte-americano segue aquecido e os salários continuam crescendo acima da produtividade. Nossa expectativa é que a inflação continue desacelerando como consequência da política monetária mais restritiva do Fed, mas que não volte à meta em um horizonte próximo.

O banco central americano (Federal Reserve, Fed) manteve a taxa de juros inalterada na decisão de junho, com o intervalo permanecendo entre 5% e 5,25% ao ano. Apesar da pausa, membros do comitê de política monetária sinalizaram que o ciclo de alta não terminou e preveem mais duas altas de 25 pontos-base até o fim deste ano. O presidente da instituição, Jerome Powell, falou recentemente que a política monetária pode ainda não estar restritiva o suficiente, dada a inflação elevada, e acrescentou que não irá afrouxar a política num futuro próximo. Acreditamos que o mercado de trabalho deve desaquecer como consequência da política monetária mais restritiva do Fed, mas este processo deve ser lento, mantendo a inflação elevada. Em nossa visão, o Fed fará mais duas altas de juros e deve mantê-los elevados por um longo tempo. Não esperamos cortes antes de meados de 2024.

O dólar desvalorizou frente às principais moedas no último mês, mas segue forte e, em nossa visão, deve se estabilizar próximo aos valores atuais em razão dos juros que devem permanecer elevados nos Estados Unidos por um longo tempo.

Europa

A guerra entre Rússia e Ucrânia se estende pelo segundo ano. Mísseis russos continuam sendo lançados sobre várias cidades. A região leste da Ucrânia é a mais afetada. Um motim, organizado por grupo aliado de Putin, contra Moscou teve curta duração, mas sugere rachaduras entre russos e confronta a liderança de Putin. O impacto político é nebuloso. O conflito segue sem perspectiva de um fim próximo.

A crise de energia na Europa diminuiu, com estoques de gás natural elevados. O preço da commodity permanece bem abaixo da média de janeiro do ano passado (menos da metade), período anterior à guerra. No mercado internacional, o preço do petróleo (Brent) segue baixo, em torno de 75 dólares o barril, refletindo uma desaceleração global, e ocorre apesar de uma redução da oferta da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP+) e cortes adicionais da Arábia Saudita. Mantemos nossa visão que uma desaceleração no crescimento global em curso e a manutenção de um dólar em patamar ainda forte tendem a reduzir o preço em dólar de produtos cotados na moeda americana.

A atividade perdeu força na área do euro, com menor expansão do setor de serviços e maior contração em manufaturas. O mercado de trabalho continua aquecido. A taxa de desemprego segue no mínimo histórico da série iniciada em 1998, em 6,5% no mês de maio.

A inflação desacelerou, mas segue pressionada. O índice de preços ao consumidor está em 5,5% nos últimos doze meses até junho, com queda no preço de energia. O núcleo da inflação, que exclui alimentos, energia, álcool e tabaco, voltou a acelerar (5,4%) no período, mostrando persistência. A inflação continua bem acima da meta de 2%.

O Banco Central Europeu (BCE) aumentou as taxas de juros em 25 pontos-base na reunião de junho, conforme esperado. A taxa de depósito foi para 3,5% ao ano – superando o pico de 2008. A presidente do Banco, Christine Lagarde, reforçou que os juros ainda devem subir em razão da persistência inflacionária. Concordamos com a visão do BCE de que ainda há um caminho a percorrer em termos de política monetária. Acreditamos que os juros devem continuar subindo e permanecer elevados por um período prolongado.

No Reino Unido, a inflação segue persistente. O núcleo, que exclui alimentos, energia, álcool e tabaco, voltou a acelerar (7,1% em 12 meses até maio) e alcançou o maior aumento em mais de 30 anos, em razão de maior pressão de serviços. O mercado de trabalho tem dado sinais de desaceleração: houve aumento na taxa de desemprego nos 3 meses até junho de 3,8% para 4%, e as contratações diminuíram, mas os ganhos por hora trabalhada continuaram subindo e as vagas em aberto permanecem em níveis elevados, o que deve continuar pressionando salários à frente.

O Banco da Inglaterra (BoE, na sigla em inglês) voltou a subir a taxa de juros em 50 pontos-base, na reunião de junho, surpreendendo as expectativas que eram de aumento de 25 pontos-base, levando a taxa para 5% ao ano – maior nível em 15 anos. O BoE reforçou que mais aperto na política monetária pode ser necessário se existirem evidências de pressão inflacionária persistente.

China

A recuperação pós-Covid perdeu o fôlego depois de um primeiro trimestre forte com a reabertura. Indicadores mostram uma contração no setor de manufaturas, com menor demanda e queda na produção, e desaceleração no setor de serviços.

Os investimentos têm crescido menos, com o setor imobiliário sofrendo em razão das baixas vendas de imóveis e alto endividamento das construtoras, que restringe novos empreendimentos. O governo anunciou recentemente a extensão de empréstimos ao setor imobiliário. A medida deve ajudar na finalização de obras interrompidas, mas não reavivar o setor.

O Banco do Povo da China (PBoC, na sigla em inglês) cortou em 10 pontos-base as taxas de juros de referência de curto, médio e longo prazo, dando um sinal de apoio à economia, depois de mantê-las paradas desde meados de 2022.

O crédito aumentou e veio mais forte que o esperado em junho, com elevação dos empréstimos bancários às empresas e famílias refletindo alívios recentes da política monetária.

A inflação segue baixa. O índice de preço ao consumidor (CPI, na sigla em inglês) ficou estável em junho, com a demanda fraca, reflexo de um desaquecimento da economia.

Existe uma expectativa de que após a reunião do Politburo, que ocorre este mês, medidas de suporte sejam anunciadas. No entanto, tais medidas devem vir no sentido de evitar uma desaceleração da economia e permitir um crescimento mais próximo da meta fixada pelo governo e não no sentindo de estimular um crescimento forte. Na maioria dos países do leste asiático, excluindo China, importantes elos na cadeia de suprimento global, o setor de manufaturas tem desacelerado. A Índia continua sendo exceção e segue com setor forte.

Cenário Doméstico

Atividade

O PIB do 1T23 registrou forte alta de 1,9% frente ao trimestre anterior, impulsionado pelo setor agropecuário. Projetamos, por ora, alta de 0,9% para o PIB do 2T23, puxado pelo setor de serviços e pela indústria. No entanto, esperamos contração da atividade na segunda metade do ano.

A taxa Selic em território contracionista afeta a atividade - os dados mostram sinais de enfraquecimento, ainda que menos intenso do que o esperado. A desaceleração do crescimento global impacta a atividade doméstica. Os altos preços de commodities, que beneficiaram o Brasil no primeiro semestre do ano passado, já mostram reversão.

Os efeitos da política monetária contracionista e da desaceleração global devem se estender ao longo de 2023 e de 2024, ainda que a estimativa de uma safra recorde de soja para 2023 e os estímulos fiscais atuem como contrapontos a esta desaceleração. Após dados correntes mais fortes do que o esperado, revisamos nossa projeção de crescimento do PIB de 2% para 2,5% em 2023. Para 2024, esperamos crescimento do PIB de 1%.

A taxa de desemprego já se encontra em patamar inferior ao seu nível neutro. O crescimento abaixo do potencial nos leva a projetar uma leve alta da taxa de desemprego até o final de 2024.

Fiscal

Após dois anos consecutivos registrando superávit primário, devemos voltar a ter déficit para o setor público consolidado neste ano. A PEC da Transição, aprovada no Congresso, sinaliza um aumento de gastos em 2023, mas a divulgação do novo arcabouço fiscal e as medidas de aumento de arrecadação devem atenuar a deterioração das contas públicas. Projetamos déficit para o setor público consolidado em 2023 de 1% do PIB e em 2024 de 0,7% do PIB.

A dívida líquida encerrou o ano de 2022 em 57,1% do PIB e deve continuar subindo em 2023 e 2024, puxada pela perspectiva de juros ainda elevados, pelo crescimento moderado do PIB e pelo aumento de gastos. Nossa expectativa para a dívida líquida de 2023 é de 59,9% do PIB ao final do ano. Para 2024, a projeção da dívida líquida é de 61% do PIB.

A situação fiscal brasileira é desafiadora e requer um forte ajuste para equilibrar as contas públicas. Apesar de o novo arcabouço ser um passo importante na direção da sustentabilidade fiscal, acreditamos que, na ausência de um significativo aumento na arrecadação, será necessária uma forte queda dos juros reais para impedir o crescimento da dívida do país.

Setor externo

A taxa de câmbio fechou o ano de 2022 em R$ 5,28. Acreditamos que a elevada dívida líquida do governo e o dólar forte em termos globais sustentam a depreciação do real. Projetamos uma taxa de câmbio para o final deste ano em R$ 5,30. À frente, a taxa de câmbio deve continuar depreciando, influenciada pela queda da Selic num contexto de juros altos nos EUA. Projetamos dólar em R$ 6 ao final de 2024.

Com relação às contas externas, apesar da taxa de câmbio depreciada, seguimos com a expectativa de transações correntes em patamar negativo. Isto ocorre porque grande parte dos ganhos com uma moeda depreciada são compensados por uma produtividade mais baixa comparada a outros países. Projetamos déficit de US$ 40 bi para 2023 e de US$ 35 bi para 2024.

Inflação

A queda do IPCA no acumulado em doze meses, que alcançou 3,2% em junho, foi influenciada em grande parte por fatores pontuais, tais como a forte redução em bens monitorados, os descontos concedidos aos automóveis e a desaceleração da inflação de alimentos. A média dos núcleos de inflação do Banco Central, que expurga esses fatores, segue elevada, em 6%. A inflação deve voltar a subir a partir do próximo mês. Projetamos que o IPCA termine o ano de 2023 em 5,8%.

A inflação de bens industriais mostra sinais claros de desaceleração na medida em que as deflações registradas nos preços de atacado vão sendo repassadas ao consumidor. A inflação de serviços já ultrapassou seu pico, mas segue elevada e resiliente. Acreditamos que ela deve continuar alta nos próximos meses em função da inércia inflacionária e do mercado de trabalho aquecido.  

O Conselho Monetário Nacional (CMN) definiu em 3% a meta de inflação de 2026, igual a de 2024 e de 2025, e anunciou uma mudança no sistema de metas para inflação.  O Brasil passará a adotar o regime de meta contínua para a inflação a partir de 2025, decisão que ainda depende de decreto do presidente da República. Na nossa visão, a decisão de manter a meta em 3% pode contribuir para o movimento de ancoragem das expectativas de inflação, ainda em curso. No entanto, a inflação irá continuar caindo a passos lentos. Projetamos alta de 5,5% para o IPCA de 2024. Importante reiterar que, apesar da diminuição da incerteza em relação à meta de inflação, a resiliência do setor de serviços impõe desafios à trajetória da inflação à frente.

Política monetária

O Copom (Comitê de Política Monetária) manteve a taxa Selic em 13,75% pela 7ª reunião consecutiva em junho.

A projeção de inflação do BCB no cenário de referência passou de 5,8% para 5% para 2023 e de 3,6% para 3,4% para 2024. Este cenário supõe trajetória de juros que diminui de 13,75% para 12,25% até o final de 2023, para 9,5% ao final de 2024 e para 9% ao final de 2025. Ou seja, as projeções de inflação do Banco Central registraram queda, mas seguem acima da meta de inflação para o ano de 2024, horizonte para o qual o Comitê dá ênfase nesta reunião.

A comunicação da ata foi mais suave e acreditamos que seja compatível com uma queda de 0,25% na taxa Selic já na reunião de agosto. O Comitê afirmou que a “avaliação predominante foi de que a continuação do processo desinflacionário em curso, com consequente impacto sobre as expectativas, pode permitir acumular a confiança necessária para iniciar um processo parcimonioso de inflexão na próxima reunião”.

Incorporamos no nosso cenário a manutenção da meta de inflação em 3% para 2026, anunciada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), e a mudança para o regime de meta contínuo. Na nossa visão, a queda registrada nas expectativas de inflação e a ampliação do horizonte relevante a partir da próxima reunião abrem espaço, nos modelos do BC, para um corte de juros de 25 pontos-base em agosto deste ano. Revisamos nossa projeção de Selic de 12,5% para 12% ao final de 2023 devido à antecipação do corte da Selic. Para 2024, revisamos a taxa de juros de 11% para 9,5% ao final do ano.

Projeções macroeconômicas do C6 Bank

2019
2020
2021
2022
2023P
2024P
Atividade
Crescimento Real do PIB
1,2%
-3,3%
5,0%
2,9%
2,5%
1,0%
PIB Nominal (R$ bi)
7.389
7.610
8.899
9.915
10.750
11.588
Fiscal
Resultado Primário (% PIB)
-0,8%
-9,2%
0,7%
1,3%
-1,0%
-0,7%
Resultado Primário (% PIB)
54,7%
61,4%
55,8%
57,1%
59,9%
61,0%
Dívida Bruta (% PIB)
74,4%
86,9%
78,3%
72,9%
76,4%
80,8%
Setor Externo
R$/US$ (final de período)
4,03
5,20
5,58
5,28
5,30
6,00
Balança Comercial (US$ bi)
27
32
36
44
59
61
Conta Corrente (US$ bi)
-68
-28
-46
-56
-40
-35
Conta Corrente (% PIB)
-3,6%
-1,9%
-2,8%
-2,9%
-2,0%
-1,6%
Inflação
IPCA (Var. a/a)
4,3%
4,5%
10,1%
5,8%
5,8%
5,5%
Juros
Selic (dez)
4,50%
2,00%
9,25%
13,75%
12,00%
9,50%

Equipe Econômica C6 Bank

Felipe Salles                   Head

Claudia Moreno      Head Brasil

Claudia Rodrigues    Head Internacional

Felipe Mecchi               Internacional

Heliezer Jacob             Brasil

Este relatório foi preparado pelo Banco C6 S.A.

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